"Não me identifico com o lado social desta profissão"

A celebrar dez anos de carreira, a atriz abre o coração à <strong>Notícias TV</strong> e fala do seu percurso, inspirações e... das personagens sensuais.
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Já domina toda a arte das conservas?

Não, mas percebo alguma coisa, até porque tivemos formação numa fábrica em Matosinhos. Não há muito que saber, e há certas coisas, como a fase da cozedura, o ter de passar pelo azeite, isso tudo, que deu para aprender nessa formação. E é mais simples do que estava à espera.

O que é que a Rute de Mar Salgado lhe tem ensinado?

Ensinou-me que as pessoas hoje se aceitam umas às outras como são, têm a mente mais aberta, em vez de apontarem logo o dedo, conseguem ver o lado positivo de cada um. Neste caso vejo que o público aceita a minha personagem como ela é, com os defeitos e as virtudes que tem. Ensinou-me a ter de acordar cheia de energia, porque é extremamente enérgica. Não posso chegar ao estúdio sem essa energia, o que por vezes não é fácil, porque é realmente cansativo. Tanto para o bem como para o mal, seja para se divertir ou para discutir.

A Rute, apesar de não ser protagonista, tem tido muito destaque na história. Ficou surpreendida com a aceitação?

Ela faz parte do núcleo cómico e realmente podia acontecer ter tanto sucesso. Não estava à espera de que acontecesse assim, mas felizmente aconteceu. E estou muito contente. A personagem está a ser muito bem aceite, as pessoas divertem-se, gostam dela, e eu própria divirto-me a ver. Algo que só me tinha acontecido aquando de O Último a Sair, na RTP1, mas em novela ainda não. Tenho necessidade de me ver todos os dias e rio--me. Acho-me divertida.

O que lhe têm dito na rua?

Há quem diga que sou mazinha, interesseira, outras pessoas, pelo contrário, dizem--me que tenho muita graça e que as divirto muito. Mas tem sido muito bom, mesmo quando dizem que sou falsa ou intriguista, a personagem realmente é assim. Significa que estou a transparecer isso para as pessoas e sabe bem.

Tem ouvido muitos piropos?

Não. Chamam-me "perigosa" porque é a música que acompanha a Rute, mas acham é graça à personagem. Ela tem um lado sensual, mas é aquele lado sensual de quem se acha muito boa e que aos olhos dos outros se calhar é um bocado parola.

A Rute volta a ser uma mulher sedutora, tal como já aconteceu em outros projetos. Já se sente a mulher fatal das novelas?

Não penso tanto assim. Sinto que estou a conseguir alcançar o meu lugar, com os trabalhos que tenho feito e vou recebendo o respeito das pessoas em relação ao meu trabalho. Mas não penso: "Ah, sou a mulher sensual, a mulher fatal." Felizmente temos mulheres muito bonitas e sensuais cada uma à sua maneira na nossa televisão.

Tem receio de ficar com o rótulo de atriz que faz personagens sensuais?

Há sempre esse receio, mas a verdade é que as pessoas são sensuais cada uma à sua maneira. E tento dar uma sensualidade diferente a cada personagem que interpreto.

Como acha que o público olha para si?

Acho que consegue separar bem as coisas. As pessoas olham para mim como uma mulher sensual, bonita, mas aos poucos tenho conseguido ganhar o respeito a nível profissional e não olham só para o lado da beleza em si. Consigo mostrar que existe uma Débora para além da personagem, para além da sensualidade. O que não é mau.

E como é que a Débora olha para si?

Sinto que ainda tenho muita coisa para aprender, mas já estou a aprender bastante. Sinto-me mais confiante, tenho mais à-vontade e estou orgulhosa do que tenho conquistado e do que tenho feito. Esta personagem está a mostrar que realmente me consigo despir de preconceitos e dar verdade e graça à personagem e estou a ser recompensada por isso.

É crítica do seu trabalho?

Bastante. Felizmente com esta personagem já consigo elogiar-me. Sou uma fã da minha Rute, mas extremamente crítica. Há cenas de que não gosto, que gravo e que achava que devia repetir e os realizadores dizem que ficou bem, mas acredito que vai ser sempre assim.

A Rute tem muito por hábito juntar duas palavras numa só. Em duas palavras numa só, como descreveria este sucesso de Mar Salgado?

Isso é muito difícil de conseguir fazer. Mas sim, Mar Salgado está a ser "maravilhástico".

A que se deve o sucesso da novela?

O elenco é muito forte. E a novela está com uma qualidade de imagem brutal. Penso que ainda não tinham feito nenhuma novela em Portugal com tão boa qualidade, pelo menos aos meus olhos, e sou mesmo fã da minha novela. Estamos mesmo de parabéns.

Preocupa-se com as audiências?

Não passo a vida a pensar nas audiências, não vou ver como foram no dia anterior, mas claro que quando chego ao estúdio e me dizem que foram boas, fico muito contente. Sabe muito bem, é sinal de que o nosso trabalho tem valor.

Mas tem consciência de que são importantes para a continuidade da novela...

Como é obvio, mas se for gravar com essa pressão, as coisas nunca vão ser naturais.

Nunca deu vida a uma protagonista. É um desejo ainda por concretizar?

Ainda não desejei interpretar uma protagonista, porque acho que não é fácil fazer uma protagonista. É muito, muito cansativo. A Rute está a entrar em vários núcleos e através da aceitação do público tenho estado a gravar ainda mais e sinto-me cansada, imagino como seria como protagonista. Claro que um dia posso vir a ter a minha protagonista, mas para já estou muito feliz com as personagens que me têm dado.

"Os atores têm de gostar do que fazem e não do que pode vir a aparecer nas revistas"

Está a celebrar dez anos de carreira. O que sente ao olhar para trás?

Sinto que cresci. Aprendi muito. Ainda bem que comecei há dez anos, mas por outro lado se calhar não devia ter começado da maneira que comecei. Não tinha experiência nenhuma.

O que sente ao olhar para Tempo de Viver, na TVI, a sua primeira novela?

Que não sabia nada e que estava ali perdida. Há cenas que estão verdadeiramente más. Realmente era muito verde, fui ali parar quase de paraquedas, o tempo de ensaios foi muito pouco, acharam que o meu perfil era perfeito para a personagem e toca a avançar. Mas faz parte da aprendizagem. Não me envergonho, porque realmente sinto que evoluí. Se não tivesse evoluído, poderia ter alguma vergonha.

Essa foi a única novela, além de Morangos com Açúcar e da série Ele É Ela, que fez para a TVI. O facto de ser muito verde prejudicou-a?

Se calhar, na altura, a imagem com que ficaram pode não ter sido realmente a melhor. Mas foi uma época em que lançaram muitas pessoas e havia muita gente a começar, umas menos maduras do que outras. Se calhar a interpretação não estava melhor em geral. Mas não sei. Aquilo que posso dizer é que estou muito feliz mesmo a trabalhar com a SP Televisão e com a SIC.

Dez anos passaram demasiado depressa?

Sim. Se calhar nas alturas em que não trabalhei, em que se põe em questão tudo, será que falhámos, acham que não conseguimos crescer ou evoluir, aí o tempo custou muito a passar.

Já teve vontade de desistir?

Não é bem vontade de desistir. É o saber que é uma profissão instável. E nesses períodos pensamos o que poderemos fazer e em que somos felizes. Existe essa dúvida. A partir do momento em que vá fazer outra coisa de que possa gostar muito, se calhar vou pôr a representação de parte. Mas desistir, não.

Como é que lida com a instabilidade da vida de ator?

Já aprendi que às vezes se sofre mais do que realmente é preciso. O que é certo é que se pode achar que as coisas estão más, mas há sempre uma solução para tudo. Já aprendi que tudo acaba por correr bem.

Nunca se sentiu deslumbrada?

Não. Já trabalhava desde os 14 anos como manequim e sabia um bocadinho como é que as coisas funcionavam, mas nunca me deixei deslumbrar.

Mas há muita gente nesta área deslumbrada com a profissão?

Sim, assim como há em outras áreas.

Porquê?

Porque se é uma figura pública e acham que isso é sinónimo de ser adorado pelos outros. Só veem o lado positivo, mas ser figura pública tem um lado bom e um lado menos bom. Nem toda a gente gosta de nós, elogia o nosso trabalho. Tem de se estar à espera de críticas positivas e negativas. Não sei o porquê de se deslumbrarem com isto, mas acho que acima de tudo têm de gostar do que fazem e não do que pode vir a aparecer nas revistas.

Ter começado no mundo da moda ajudou-a a ter esta mentalidade?

Talvez. Mas acima de tudo é algo que está com cada um de nós e que tem que ver com os nossos objetivos. E ou se tem o objetivo de ser ator ou de ser famoso.

Ter passado pelo mundo da moda fê-la ter a noção de que ia viver da imagem?

A imagem é um instrumento de trabalho, mas acima de tudo quero sentir-me bem para mim, porque se não estiver bem comigo, não vou estar bem para os outros. Sei que isso é essencial para o meu trabalho, mas como atriz tenho de estar disposta a se calhar um dia ter de engordar, ou emagrecer muito e mudar a imagem, rapar o cabelo. E adorava que um dia me dessem essa oportunidade, porque aí ajudar-me-ia a libertar-me dessa imagem que as pessoas têm em relação a mim. De ser sensual.

Sentiu algum tipo de preconceito por ter vindo do mundo da moda?

Senti esse preconceito, mas também comecei a trabalhar como atriz numa altura em que muita gente veio do mundo da moda.

Ser uma mulher bonita fê-la ter o trabalho redobrado e mostrar que não é apenas isso?

Ao início pensei muito nisso, hoje já não tenho que pensar tanto. Acaba por ser um entrave para avançar. Não temos de estar sempre a provar algo aos outros. Isso é ridículo.

Trabalhar desde os 14 anos obrigou-a a crescer demasiado depressa?

Provavelmente, mas tive uma infância e uma adolescência absolutamente normais. Mas se calhar ao nível da gestão financeira, no sentido das minhas responsabilidades, fez que crescesse mais rápido.

Os seus pais sempre a apoiaram?

Sim, e foi muito importante ter essa força.

Veio cedo viver para Lisboa e deixou o Porto, onde nasceu, para trás. Imagina-se a voltar a viver na Invicta?

Não. Agora quando vou durante uma temporada mais prolongada, sinto que já não tenho nada para fazer, que me falta qualquer coisa. Mas se começassem a fazer novelas no Porto, se começassem a investir, não sei...

Custa-lhe que não existam tantas oportunidades nesta área no Norte?

Claro. Adorava que houvesse mais oportunidades no Porto. Temos tanto talento do Norte em Lisboa, porque não vão atrás deles?

Como é que lida com a exposição pública inerente ao seu trabalho?

Não lido bem [risos]. Sendo figura pública, trabalhando como atriz, tenho de aparecer, dar entrevistas. Gosto muito do que faço, mas não me identifico com o lado social desta profissão. Não me sinto ainda à vontade com esse lado. Porquê? Porque acho que as pessoas se iludem e não dão o valor que é preciso dar. Esta necessidade de ter de aparecer, ir a eventos. Infelizmente estamos num país pequeno, e quem não aparece é esquecido. E lá fora há atores que não vão a eventos e não deixam de ser bons atores por causa disso. Aqui parece que, se não aparecemos, já não somos vendáveis.

Magoa-a certas coisas que se escrevem sobre a vida pessoal?

Felizmente nunca disseram nada de grave a meu respeito, se calhar porque tenho um lado mais recatado e assim não me chateiam tanto.

Mas ver pessoas que lhe são queridas serem afetadas, como aconteceu com o seu namorado, Miguel Mouzinho, que ainda é associado a outra figura pública, a atriz Rita Pereira, com quem também namorou, deixa-a triste?

Não tenho nada que ver com isso, passa-me ao lado. Custar-me-ia se desse valor, mas como não dou valor, não me custa.

Tem saudades do anonimato?

Não. Estou bem como estou, no meu cantinho.

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